quinta-feira, maio 08, 2008
Recessão democrática
Thomas Friedman
07 de maio de 2008
Há duas recessões importantes acontecendo hoje no mundo. Uma delas atraiu enorme atenção. É a recessão econômica dos Estados Unidos. Mas ela eventualmente vai passar, e o mundo não ficará muito pior para se viver. A outra recessão, entretanto, não atraiu tanta atenção. É a chamada "recessão democrática" que, se não for revertida, transformará o mundo por muito tempo.
O termo "recessão democrática" foi cunhado por Larry Diamond, cientista político da Universidade Stanford, em seu novo livro "The Spirit of Democracy" ("O Espírito da Democracia"). Os números contam a história. No final do ano passado, a Freedom House, organização que acompanha tendências democráticas e eleições ao redor do mundo, notou que 2007 foi, de longe, o pior ano para a liberdade democrática no mundo desde o final da Guerra Fria. Quase quatro vezes mais países - 38 - sofreram uma queda em seu nível de liberdade em relação aos que melhoraram - 10.
O que explica isso? Grande parte desse retrocesso é conseqüência do aumento do petro-autoritarismo. Há tempos venho argumentando que o preço do petróleo e o avanço em direção à liberdade funcionam numa relação inversa - chamada de "a primeira lei da petro-política". Conforme o preço do petróleo aumenta, o avanço para a liberdade diminui. Quando o preço do petróleo diminui, aumenta o avanço para a liberdade.
"Há 23 países no mundo em que pelo menos 60% da receita das exportações vêm do petróleo e da gasolina, e nenhum deles é uma democracia", explica Diamond. "Rússia, Venezuela, Irã e Nigéria são os garotos-propaganda" dessa tendência, onde os líderes se agarram à torneira de petróleo para se estabelecerem no poder.
Apesar de o petróleo ter um papel fundamental no enfraquecimento da onda democrática, ele não é o único fator. O declínio da influência e da autoridade moral dos EUA também tem sua quota de responsabilidade. A tentativa de Bush de construir uma democracia no Iraque é tão desastrosa, tanto por parte dos americanos quanto dos iraquianos, que a habilidade e a disposição dos EUA em trabalhar pela democracia em outros lugares ficaram prejudicadas. Os escândalos de tortura em Abu Ghraib e Guantánamo também não ajudaram. "Nos últimos anos houve um desperdício enorme tanto do "soft power" [poder de persuasão pela diplomacia, cooperação e influência cultural] quanto do 'hard power'[medida realista de poder predominante, por meio de grandes números, como tamanho de população, tecnologia militar ou o PIB de um país] dos Estados Unidos", diz Diamond, que trabalhou no Iraque como especialista em democracia.
[...]
Mas também devemos fazer o possível para desenvolver alternativas ao petróleo com o objetivo de enfraquecer os petro-ditadores. Essa é outra razão pela qual a proposta de John McCain e Hillary Clinton de suspender a taxa sobre a gasolina durante o verão - para que os americanos possam dirigir mais e manter o preço da gasolina alto - não é um presentinho inofensivo. Tampouco é o fim da civilização. É apenas mais um prego no caixão da democracia em todo o mundo.
(Online)
Tradução: UOL
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