A crise das abelhas tinha sido tratada como uma preocupação de nicho até agora, mas enquanto o índex da ONU de preço de alimentos atinge a maior alta de todos os tempos, está se tornando urgente saber se a situação das abelhas põe um risco mais exaustivo a nossa segurança alimentar.
Quase um terço da produção agrícola mundial depende da polinização animal, principalmente por abelhas. Esses alimentos proporcionam 35% de nossas calorias, a maior parte de nossos minerais, vitaminas, e antioxidantes, e as fundações da gastronomia. No entanto as abelhas estão morrendo, ou sendo mortas, a um ritmo impressionante.
A história da "desordem de colapso da colônia" ( CCD, em inglês) já é bem conhecida dos leitores do Daily Telegraph. Alguns mantêm colméias em casa e tem experimentado essa misteriosa praga, e sem dúvida tem opiniões fortes sobre se ela é causada por parasitas, ou um vírus ou o uso de pesticidas que causam estragos no sistema nervoso das abelhas jovens ou uma sinergia de forças destrutivas atuando juntas.
A crise das abelhas tem sido tratada como uma preocupação de nicho até agora, mas como o índex de preço de alimentos da ONU alcança o nível mais alto de todos os tempos em termos reais (não apenas nominal) e a escassez de grãos dispara revoluções no Oriente Médio, está se tornando urgente saber se a situação das abelhas arrisca esgotar a nossa margem já delicada de segurança alimentar global.
O financiador do agronegócio Rabobank disse que os números de colônias de abelhas nos Estados Unidos que fracassam em sobreviver a cada inverno cresceu de 30 para 35% de um modelo histórico de 10%. A taxa é de 20% ou mais em grande parte da Europa, e o mesmo padrão está emergindo na América Latina e na Ásia.
Albert Einstein, que gostava de fazer afirmações ousadas (frequentemente erradas), disse famosamente que "se a abelha desaparecesse da superfície do globo, o homem teria apenas quatro anos para viver".
Esses "cenários apocalípticos" já passaram, disse Rabobank. As espigas de milho, trigo e arroz são todas polinizadas pelo vento.
Contudo, a polinização animal é essencial para avelã, melões e grãos e desempenha vários papeis em frutas cítricas, maçãs, cebolas, brócolis, repolho, brotos, abobrinha, pimentas, berinjela, abacate, pepinos, cocos, tomates e favas, bem como café e cacau.
Esta é a parte da economia agrícola mais valiosa e de mais rápido crescimento. Entre 80 e 90% da polinização vem de abelhas domesticadas. Mariposas e borboletas não têm autonomia para penetrar grandes campos.
O reservatório de abelhas está diminuindo ao ponto onde as taxas estão perigosamente fora dos eixos, com os Estados Unidos alcançando o desequilíbrio "mais extremo". A produção de safras polinizadas quadruplicou desde 1961, porém, as colônias de abelhas diminuíram pela metade. A contagem de abelhas por hectare caiu quase 90%.
"Os agricultores têm conseguido produzir com colônias de abelhas relativamente menores até aqui, e não há evidência de rendimentos agrícolas sendo afetados. A questão é quanto tempo mais essa situação pode ser esticada", disse o relatório.
O Rabobank disse que as colônias de abelhas nos Estados Unidos estavam encolhendo mesmo antes do golpe de CCD (Desordem de Colapso da Colônia) porque as importações baratas de mel da Ásia minaram as colméias americanas. Note o paralelo entre o desaparecimento da indústria de metais de terra rara nos EUA, colocadas fora dos negócios quando a China inundou o mundo com materiais mais baratos nos anos 1990. Isso é o que acontece quando o livre comércio é administrado descuidadamente.
A China tem seus próprios problemas. Pesticidas usados em pomares de peras varreram as abelhas em partes de Sichuan nos anos 1980. As safras são agora polinizadas à mão, usando vassouras, um processo trabalhoso, visto que uma colônia de abelhas pode polinizar até 300 mil flores por dia.
Alemanha, França e Itália baniram alguns pesticidas, especialmente neonicotinóides (como no tabaco) que prejudicam a memória das abelhas.
A Associação de Apicultores Britânicos tem apelado por uma "revisão urgente" desses produtos químicos, temendo que possam perder todas as suas abelhas dentro de uma década se não tiverem cuidado. Os apicultores americanos têm feito declarações semelhantes. O Laboratório de Pesquisa de Abelhas do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos encontrou evidência de que mesmo baixos níveis destes pesticidas reduzem a resistência das abelhas a fitopatógenos.
Documentos vazados da Agência de Proteção Ambiental confirmam que a clotianidina usada em sementes de milho é "altamente tóxica", pode representar um "risco de longo prazo" para as abelhas, e que os testes anteriores eram falhos.
Os críticos alegavam um encobrimento: O Rabobank disse que deveríamos ser cuidadosos para não difamar a agro-indústria. O mundo precisa de alimentos e fábricas de fertilizantes para continuar a descobrir meios de elevar a produtividade das culturas, se vamos alimentar mais de 70 milhões de bocas extras todo ano, e atender as demandas da revolução da dieta na Ásia, compensar a escassez de água na China e na Índia, e desviar colheitas de grãos de um grande pedaço dos Estados Unidos, da Argentina e da União Europeia para fazer biocombustíveis para carros.
Com as garras se fechando sobre a produção de alimentos do mundo de tantos lados, temos pouca margem para errar. Os cientistas estão chegando para o resgate. A pesquisa está no fungus Nosema e no ácaro Varroa, mas não rápido o suficiente.
O Rabobank pede uma mudança de direção na pesquisa global, e enquanto isso por regras mais duras, de forma que os apicultores não tenham que lutar sozinhos, começando com restrições ao uso de pesticidas durante as horas do dia quando as abelhas estão se abastecendo.
A atrofia das abelhas é uma ameaça mais imediata do que o aquecimento global e pode ser resolvida, ainda que evolua pouco na tela do radar da política. Isso é certamente um equívoco.
Einstein não estava sempre errado.
Fonte: The Telegraph
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